Anistia aos envolvidos no 8 de janeiro: Uma realidade coerente?   Migalhas

Anistia aos envolvidos no 8 de janeiro: Uma realidade coerente? – Migalhas

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A eleição de Hugo Motta como presidente da Câmara dos Deputados reacendeu o debate sobre a anistia aos envolvidos nos eventos de 8/1/23, vista por alguns como um caminho para a pacificação.

Entretanto, é essencial avaliar seus impactos jurídicos e institucionais, além dos reflexos políticos e sociais que uma medida dessa magnitude pode gerar.

A anistia é, inicialmente, um instituto jurídico destinado a perdoar crimes, comumente relacionados a contextos políticos, promovendo, de certo modo, uma reconciliação social.

Contudo, sua aplicação tem algumas limitações intrínsecas como, por exemplo, o não enfraquecimento do Estado Democrático de Direito, vez que a CF/88, em seu art. 5º, inciso XLIII, define os crimes contra a ordem constitucional como inafiançáveis e imprescritíveis, o que esvaziaria, ao menos em tese, a concessão de anistia nestes casos.

Outrossim, é de se notar que o ordenamento jurídico brasileiro busca garantir que crimes de grande impacto e repercussão sejam tratados com a seriedade que merecem, a fim de preservar a confiança pública nas instituições.

Sob este viés, a experiência histórica nos mostra os riscos da clemência concedida aos delitos que afetam as instituições democráticas, a partir do exemplo deixado pela lei 6.683/1979, que anistiou os crimes cometidos na ditadura militar sendo, posteriormente, rechaçada por cortes internacionais, que cobraram providências do Brasil.

Portanto, repetir precedente semelhante a este pode prejudicar a credibilidade das instituições brasileiras e gerar insegurança jurídica, considerando que tal medida pode abrir brechas para que futuras infrações sejam tratadas com leniência, comprometendo o caráter dissuasório da punição.

Ademais, é necessário considerar que a concessão de anistia em contextos de repercussão internacional e grande instabilidade interna também pode ser interpretada como interferência no Poder Judiciário, comprometendo a harmonia dos poderes da República e sugerindo, sob olhares pretensiosos, que atos contrários à ordem democrática podem ser perdoados sem maiores consequências, afetando a credibilidade do sistema de justiça brasileiro.

Além disso, o perdão aos atos do 8 de janeiro pode enfraquecer a imagem da nação no cenário internacional, afetando sua posição em organismos multilaterais, podendo comprometer futuras negociações políticas e econômicas com países que priorizam a estabilidade democrática.

Deste modo, em vez de pacificação, a anistia pode gerar ainda mais polarização e questionamentos sobre a impunidade, levando-se em conta o risco de que setores políticos passem a enxergar tais medidas como estratégias de curto prazo, utilizadas para atender interesses específicos sem considerar os efeitos de longo prazo na ordem institucional.

Importante consignar, ainda, a possibilidade de que parlamentares contrários à medida contestem a sua constitucionalidade judicialmente, gerando um maior desgaste na relação entre o Legislativo e o Judiciário, dificultando, ainda mais, o consenso político almejado.

Considera-se, portanto, a necessidade de um debate responsável sobre as consequências de conceder a anistia em um cenário no qual busca-se o fortalecimento das instituições e a responsabilização criminal como um pilar do Estado Democrático de Direito, garantindo que a ordem constitucional seja respeitada e protegida.

Leonardo Tajaribe Jr.

Leonardo Tajaribe Jr.

Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM). E-mail: [email protected]

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