Demissão de gestantes: A persistência da discriminação no trabalho   Migalhas

Demissão de gestantes: A persistência da discriminação no trabalho – Migalhas

CompartilharComentarSiga-nos noGoogle News A A

Prática discriminatória que transcende o tempo e permanece viva em pleno sec. XXI.

A trajetória das mulheres em busca de igualdade no mercado de trabalho é marcada por inúmeros desafios ao longo do tempo, embora se reconheça avanços significativos ao longo das décadas, a discriminação ainda se manifesta de diversas formas, sobretudo quando a gravidez mulher, fato natural e inevitável. A dispensa de uma trabalhadora pelo simples fato de estar grávida não é apenas uma afronta aos direitos individuais, mas também uma prática que perpetua estigmas, preconceitos e prejuízos sociais num contexto em que a proteção à maternidade deveria ser prioridade, haja vista que perpetua a existência da espécie humana.

Um olhar histórico: A realidade antes da Constituição de 1988

Antes da promulgação da CF/88, as trabalhadoras gestantes enfrentavam um cenário de extrema vulnerabilidade legislativa. Embora a lei 6.136/74 já previsse uma licença-maternidade de 84 dias, a ausência de garantias constitucionais contra a dispensa arbitrária ou discriminatória fazia com que muitas mulheres perdessem seus empregos logo após a confirmação da gravidez.

A gravidez desde aquela época era vista como um “problema para empresa” que implicava afastamento temporário devido a exames, consultas e licenças, além, havia uma diminuição da força de trabalho devido à indisposição, enjoos e afastamentos.

Assim, para fins puramente empresariais, a demissão era a melhor saída, a fim de não comprometer a segurança econômica da empresa.

Avanços jurídicos e o combate à discriminação

A Constituição de 1988 representou um marco ao consagrar o direito à estabilidade no emprego para gestantes, impedindo a demissão sem justa causa desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, conforme disposto no art. 10, inciso II, alínea “b”, do ADCT. Esse dispositivo legal não só reforçou a proteção da trabalhadora, mas também reconheceu que a maternidade não pode ser tratada como um “problema” para empresa.

Além disso, a lei 9.029/95 reforçou o combate às práticas discriminatórias no ambiente de trabalho, vedando expressamente a demissão motivada pela gravidez. Quando comprovada a discriminação, a legislação assegurou à gestante o direito de ser reintegrada à função ou, alternativamente, a receber uma indenização, em dobro, que compense os salários perdidos durante o período de estabilidade.

Os desafios cotidianos no ambiente de trabalho

A gestação impõe uma série de transformações físicas e emocionais que demandam compreensão e apoio por parte dos empregadores. Sintomas como enjoos, cansaço e a necessidade de cuidados médicos constantes evidenciam que, longe de ser um obstáculo, a gravidez é um momento delicado que merece ser acompanhado com respeito e condições adequadas de trabalho.

Registre-se, ainda, que de acordo com o art. 394-A da CLT e com normas como a NR-15 do Ministério do Trabalho, uma trabalhadora gestante não pode ser exposta a ambientes insalubres que possam prejudicar sua saúde e a do bebê. Assim, se o local de trabalho apresentar condições nocivas, a empregada deve ser realocada para uma função segura, garantindo a proteção da mãe e do nascituro.

Entretanto, é frequente que gestantes sejam tratadas com desconfiança e, em casos extremos, demitidas sem justificativa plausível, o que configura uma prática ilegal e profundamente discriminatória.

Reintegração ou indenização

Em caso de demissão ilegal, a lei confere à gestante a opção de buscar a reintegração ao emprego ou optar por uma indenização. A jurisprudência da maior corte trabalhista do Brasil – TST, tem definido que a própria trabalhadora pode preferir não retornar a um ambiente que, por vezes, se mostra hostil ou desvalorizador. Independentemente da escolha, a legislação visa garantir que a mulher não seja penalizada financeiramente durante um período em que a segurança e o bem-estar devem prevalecer, protegendo não apenas a mãe, mas também ao nascituro (bebê).

A importância da estabilidade para mãe e filho

A estabilidade no emprego transcende a proteção individual da gestante; ela é fundamental para assegurar condições dignas para a criação e o desenvolvimento do bebê. O amparo legal possibilita que a mulher enfrente a gravidez com a tranquilidade necessária para garantir uma gestação saudável, livre do temor constante de perder o sustento familiar. Dessa forma, a legislação não só resguarda o direito ao trabalho, mas também contribui para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.

Assim, a perpetuação de demissões de cunho discriminatório pode gerar uma insegurança nas trabalhadoras e desestimulação geral na decisão de ter filhos, contribuindo para uma queda progressiva na taxa de natalidade e, em um raciocínio extremo, sugerindo que tal prática poderia levar, a longo prazo, à diminuição da população de forma tão acentuada que até mesmo se cogitasse a hipótese da extinção da espécie humana; contudo, sabemos que dificilmente isso irá acontecer, mas devemos reafirmar a necessidade de políticas públicas eficazes e de proteção dos direitos das mulheres para garantir um ambiente de trabalho que valorize a maternidade e promova erradicação da demissão arbitrária.

Considerações finais

A prática da demissão de gestantes é uma manifestação de preconceito que precisa ser erradicada de vez. A legislação brasileira, ao estabelecer dispositivos que protegem a maternidade, reforça o compromisso com a igualdade de direitos e o respeito à dignidade humana. É fundamental que, diante de qualquer situação de discriminação, as trabalhadoras busquem orientação jurídica para assegurar que seus direitos sejam integralmente respeitados. Somente assim poderemos avançar rumo a um ambiente de trabalho verdadeiramente inclusivo, onde a maternidade seja celebrada e protegida como um direito inalienável.

Jorge Lopes Bahia Junior

Jorge Lopes Bahia Junior

Jorge Lopes Bahia Junior. Advogado trabalhista. Advogado especializado em Direito do Trabalho, atuando na defesa dos trabalhadores desde 2017. Atuou em mais 2.500 processos trabalhistas em todo Brasil

Leave a Comment

Your email address will not be published. Required fields are marked *