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Decreto nº 4.729/2003 e a possibilidade do administrador não empregado nas sociedades limitadas
Juliana Bracks Duarte*
Muito embora engenheira formada, acabei optando pelo Direito, não só pelo histórico familiar, mas principalmente pela constante mutação e atualização técnica que nos impõe. Na área previdenciária, especialmente, não há rotina, nem solidez de posicionamento.
Há dois anos, o Ministério da Previdência e Assistência Social (“MPAS”) divulgou o Parecer nº 2.484/2001, por meio do qual concluía ser inadmissível a figura do diretor empregador em uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada:
“não existe a figura do diretor empregador na sociedade por quotas. Neste tipo de sociedade, o contribuinte individual ou será sócio quotista ou será sócio gerente. Se a sociedade por quotas de responsabilidade limitada elege um diretor o faz na qualidade de empregado, nunca de empregador. Situação completamente diferente ocorre no caso das sociedades anônimas. Aqui, há como falar em diretor empregado ou não empregado, tendo em vista que esse tipo de sociedade possui a diretoria como seu órgão de administração, prevendo que o diretor eleito pode ou não ser acionista da empresa, caso em que será diretor não empregado (condição de empregador) e diretor empregado, respectivamente.”
Já na ocasião, manifestamos nosso desacordo com o referido Parecer, uma vez que o Decreto nº 3.708/19, em seu art.13, permitia a delegação do uso da firma pelos sócios gerentes, o que sempre foi usual nas empresas. Ademais, o art.18 autorizava a aplicação subsidiária dos dispositivos das sociedades anônimas às por quotas de responsabilidade limitada, sempre que não houvesse conflito entre os dois regramentos. Não existia dúvida, portanto, ao menos no âmbito societário, sobre a possibilidade de se nomear um gerente delegado estranho ao quadro social da companhia.
O Novo Código Civil revogou os artigos mencionados acima, mas manteve a possibilidade de transferir a gerência da companhia a um terceiro, não quotista, desde que o contrato social assim preveja e seja respeitado o quorum mínimo necessário à tal aprovação (art.1.061). O Parecer do MPAS continuava contrário à legislação atual, inequívoca quanto à admissibilidade de se ter um chamado “diretor empregador” em uma sociedade limitada.
Para a surpresa de muitos, em junho de 2003, foi publicado o Decreto nº 4.729, que alterou a redação do art.9º, V, “h”, do anterior Decreto nº 3.048/99 e admitiu, expressamente, a possibilidade de um administrador não empregado nas sociedades por quotas de responsabilidade limitada.
Assim, em termos previdenciários, não há mais óbice para essa figura, bastando, para tanto, que (i) o diretor seja indicado ou eleito pelos órgãos competentes da sociedade, de acordo com o previsto no estatuto ou contrato social; e (ii) desenvolva suas funções sem subordinação jurídica, com verdadeiros poderes de representação da sociedade, tanto perante terceiros, como internamente.
O Decreto nº 4.729/2003, no que diz respeito à chancela do administrador não empregado nas limitadas, veio ao encontro da doutrina e da legislação societária, retratando uma adaptação do MPAS à realidade empresarial brasileira. Não obstante, as sociedades ainda devem se preocupar com as nomeações de “fachada”, evitando que os “diretores empregadores” sejam meros (empregados) exercentes de cargos de confiança, sem a assunção das responsabilidades inerentes ao verdadeiro empreendedor e titular da marcha do negócio.
Nesta hipótese, onde a delegação é apenas aparente, continua presente o risco de ajuizamento de ações trabalhistas por parte dos referidos diretores, para pleitear o reconhecimento do vínculo empregatício e todos os efeitos dele decorrentes (férias, 13º salários, depósitos de FGTS – facultativos para os diretores empregadores -, verbas rescisórias etc.).
A empresa também pode vir a sofrer uma autuação por parte de Auditores do Trabalho ou Fiscais do INSS, entendendo estes, respectiva e exemplificativamente, que haveria empregado (sob o rótulo de falso administrador) trabalhando dentro da empresa sem o respectivo registro (anotação da CTPS, ficha de registro do funcionário etc.) e sem que tivessem sido feitos os devidos recolhimentos previdenciários.
Assim, em que pese, agora, a inexistência prévia de óbice à figura do administrador não empregado nas sociedades limitadas, continua sendo necessário verificar as condições práticas em que a gestão é desenvolvida, tendo sempre em mente o Princípio da Primazia da Realidade, norteador das relações trabalhistas e previdenciárias.
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* Advogada do escritório Pinheiro Neto Advogados
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Atualizado em: 25/7/2003 12:59